2020 está sendo um ano de desacomodações. Costumeiramente aprisionado no dia 20 de novembro, o Dia da Consciência Negra pulou para fora do calendário, ocupando espaços e levantando questionamentos.
O que latente estava, veio para a superfície. Embora a violência concreta e simbólica – produzida pelo racismo estrutural – estivesse explícita para observação cotidiana, entranhada nos laços sociais, foi o assassinato de George Floyd que se manifestou como sintoma e escancarou o conflito.
Mas já circulava entre nós um incômodo que precisava ser nomeado. O tema do racismo havia sido trazido no Encontro de Estudantes do ESIPP de 2019, e nossa Jornada Científica de 2020 também trilhou por este caminho ao se intitular “Agressões Invisíveis”, assim como a aula inaugural que abriu o segundo semestre de 2020 – tratando da indiferença e da violência.
Como as demais instituições que têm na psicanálise seu aporte teórico, a turbulência que colocou as relações raciais em plano privilegiado de discussão também se oferece a nós para que possamos pensá-la com seriedade e encará-la de frente.
Uma possibilidade é nos depararmos com conceitos que possam nos ajudar a entrar em contato com uma parcela da realidade até então negada por nós. Conceitos estes como branquitude, racismo estrutural, colonialismo, políticas afirmativas.
Outro viés é buscarmos o entendimento pela ótica psicanalítica, nos valendo de ideias freudianas como o “narcisismo das pequenas diferenças”, “pulsão de morte”, “o estranho”, “ideal do eu”, “desmentida”. Ou ainda pensar outros aportes psicanalíticos que possam aprofundar e enriquecer a compreensão de um tema tão complexo.
E a clínica? Temos pacientes negros? As questões da negritude aparecem no tratamento? Na transferência e na contratransferência? E se não se fazem presentes, por quê? Temos colegas negros? Por que esse número é tão desproporcional?
Desacomodações. Pensar o racismo, pensar psicanaliticamente o racismo, pensar o racismo na clínica. Pensar não porque dia 20 de novembro é o Dia da Consciência Negra. Mas pensar permanentemente porque temos um compromisso ético com a verdade.
Autora: Larissa Ullrich, Membro Efetivo do ESIPP.
Comments