Tendo por base a segunda geração de analistas fugidos dos horrores da Segunda Guerra, a psicanálise nos EUA, a partir da década de 40, começa a se consolidar como a principal forma de tratamento para as doenças mentais naquele país.
O pioneirismo de Hartmann, Kris e Loewenstein, no trabalho com o modelo estrutural da mente, logo se expande para incluir Mahler, Jacobson, Erikson e Spitz com suas pesquisas observacionais e de campo sobre o desenvolvimento psicológico. Aos poucos vai se descobrindo que o intrapsíquico está em constante associação dialética com o interpessoal; que o mundo interno depende do externo e que este por sua vez age sobre a realidade interior que irá operar sobre a realidade exterior de formas infinitas. Não apenas o esqueleto mental havia sido dissecado, mas a pessoa (o self) em formação passava a ganhar proeminência no escrutínio atento de Kohut e de seus Psicólogos do Self. Da revisão radical promovida por Kohut surge uma disputa acirrada, que levou Kernberg a batalhar ao longo dos últimos 40 anos, para preservar o protagonismo das pulsões sem negar a importância das relações objetais.
Os maiores beneficiários dessas disputas no centro do debate científico da comunidade psicanalítica americana foram, sem dúvida, os pacientes. As primeiras pesquisas sobre processo e resultado de tratamento já estavam frutificando. Os critérios diagnósticos foram aperfeiçoados e por consequência o escopo dos casos se ampliou. Através de mudanças técnicas significativas pacientes não-neuróticos, com patologias de personalidade caracterizadas por atuações graves, passaram a ser tratados psicodinamicamente.
Porém, depois de uma terceira e quarta geração marcadas por avanços incríveis a psicanálise começa a dar sinais de fragmentação. As portas de completar cem anos e devido a inúmeras razões, dentre as quais a ausência de uma figura unificadora, mas em especial sobre quais seriam, de fato, os fatores curativos – a interpretação e o insight ou a relação terapeuta-paciente – Wallerstein, então presidente da IPA, consente pelo pluralismo de ideias. A partir daí começa uma pulverização do campo e guetos psicanalíticos são consolidados: os Relacionais, os Intersubjetivistas, os Psicólogos do Ego contemporâneos, os Neo-freudianos, os Psicólogos do Self, os Interpessoalistas,… .
Kuhn havia descrito, em sua filosofia da ciência, que novos paradigmas surgem quando o modelo vigente já não responde mais as questões importantes de uma determinada área e um clima de insatisfação se instala em alguns membros daquela comunidade científica. Este seria o caso da Psicanálise Americana? Devemos continuar nos referindo a uma psicanálise americana ou seriam várias?
Autor: Rafael Wellausen, Membro Efetivo do ESIPP.
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