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Luiza Feijó

Reflexões sobre a influência da cultura no que entendemos sobre o feminino e masculino

O que significa ser mulher em uma sociedade machista patriarcal? O que é permitido às mulheres e o que é permitido aos homens? O que é exigido de cada um? Meu viés é de alguém que se redescobriu como mulher, ao mesmo tempo em que começou a criar dois filhos meninos nessa sociedade.

“Senta que nem mocinha”, “se comporta” são frases que me lembro da minha infância. Uma sensação de que eu deveria ser boazinha, seguir o que me era pedido, e de que alguém, sempre outra pessoa, saberia qual o caminho que eu deveria tomar. Colete Dowling coloca em seu livro “Complexo de Cinderela” o quanto nos é ensinado que devemos depender de alguém, e o quanto, na maioria das vezes, não somos treinadas a lutar para encarar o mundo. Entregamos cuidado afetivo para que nos cuidem na vida lá fora. Uma bolha protegida para as meninas, em tese, mais frágeis. Ao serem cuidadas, aprendem a cuidar, e esse saber cuidar cobra o seu preço mais adiante, quando essas meninas se tornam mulheres e enfrentam sobrecarga por ter que dar conta de todos os cuidados envolvidos na estrutura familiar.

Ao me tornar mãe me dei conta do quanto a sociedade espera uma criação diferente para meninos e meninas. Como mãe de dois meninos entendi que para eles existe um encorajamento para desbravar, ser aventureiro e independente (ninguém manda os meninos sentarem de uma determinada maneira). Mas percebi também o tanto que lhes é negado e negligenciado. A possibilidade de serem sensíveis, delicados, afetivos. A possibilidade de aprenderem a cuidar ao brincar de boneca, por exemplo. O quanto é negado aos meninos a liberdade para usarem qualquer cor que desejarem. O quanto lhes é permitido expressar seus sentimentos apenas em momentos específicos, como no futebol por exemplo, e, quase sempre, de maneira agressiva.

De que forma essas limitações de gênero impostas a meninos e meninas vão moldando a subjetivação como sujeito de cada criança que está se desenvolvendo? No livro “Os meninos são a cura do machismo”, Nana Queiroz aponta que a sociedade patriarcal cria os homens com uma série de liberdades desmensuradas exceto por uma liberdade central: a de sentir e trocar sentimentos Se garante a perpetuação da opressão ao oprimir.

Nesse mês que celebra o Dia Internacional da Mulher minhas reflexões passaram muito pelo tanto de luta que ainda temos pela frente: buscando mais representatividade e expressão em cargos importantes na política, lutando por denunciar e punir comportamentos misóginos, lutando para reduzir o número de feminicídios e abusos em todos os locais ocupados por meninas e mulheres. Mas ao olhar para os meus dois meninos nesse dia, refleti também sobre a importância de pensarmos e educarmos de forma diferente os meninos de hoje, e que logo serão os homens que poderão ser nossos aliados ou opressores. É fundamental que as meninas sigam sendo incentivadas a serem mais autônomas e livres, assim como penso ser fundamental permitir aos meninos liberdade para expressar seus sentimentos, assim como incentivo para ocuparem o lugar de cuidadores. Os meus filhos tinham bonecos bebês que eles cuidavam e ninavam quando eram menores, “treinando para serem pais”, como eles diziam. Sempre puderam usar rosa, verde, roxo, colorido, brilhoso, qualquer cor que desejassem (mesmo que o comentário de que os crocs rosa escolhidos não eram coisa de menino tenha sido ouvido mais de uma vez). Nunca foram obrigados a praticar futebol quando o desejo era de fazer patinação (mesmo que só houvessem meninas na turma). E sempre puderam chorar à vontade.

Será que um mundo no qual as meninas não precisem mais sentar como mocinhas e os meninos possam dançar balé terá condições de ser um lugar mais justo para todos? Eu aqui sigo torcendo que sim.

 

Luiza Feijó

Psicóloga

Mestra em Cognição Humana

Membro Associado do ESIPP

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